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quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Nos Caracoles


Toda a vida parece traduzida nessa estrada : ainda que dê muitas voltas em torno de um imenso precipício, que faça prender a respiração a cada curva e que levante um pouco da poeira, nos consternando com um cenário tão grandioso, distante e, ao mesmo tempo, tão íntimo, a estrada, a estrada...só segue.

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Da volta

Tantas coisas eu tenho a contar que coloco tudo num pedacinho de mar.  Que é pra deixar assim mesmo à deriva e ver tudo partir pra alguma paragem distante a procura de um abraço, de uma grama verde, de uma montanha silenciosa, de um rio pedregoso, de uma acerola colhida do pé pelo vento. Um dia eu também parto para esse lugar, a reencontrar-me com tudo o que foi e que segue, a reencontra-me com o todo sem começo e sem fim.

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Das flores e dos temporais

Quando ela partia, era como se o mundo inteiro virasse poeira. Todos os dizeres pareciam apequenados e fatalmente irritantes. Não importava quem os dissesse ou mesmo os seus intuitos e desejos. As coisas faladas agora enchiam o mundo de peso, roubavam-lhe a leveza que ela havia deixado. Se debatendo para não admitir esse momento, lançava-se impiedoso contra todos. Em ataques furiosos daquilo que poderia ser um pouco de mau humor ou rebeldia desconhecida, atacava para sentir a vida. Queria mesmo pensou, era impedir todos, segurá-los pelo braço e lavá-los com alguma humanidade que nele restara.  Havia sido, então, somente isso. Um punhado de pessoas desfazendo-se nas miudezas, sendo apagadas por muito pouco, acreditando em suas crenças quase inúteis, sonhando os desvarios de uma loucura completamente apodrecida. Vendo essa barbárie sem rumo, atravessou o outono. Lá ainda era primavera.    

segunda-feira, 10 de maio de 2010

Eu sei

Acabei de ler A Vida Está em Outro Lugar. Não preciso de muito esforço e reflexão para assegurar que o que mais gostei foi o título. Essa preferência absurda em relação à própria narrativa não significa que desgostei da história. Em absoluto. Kundera é uma descoberta. Só ele sabe fazer doer a alma com tanta paz. E isso, até então para mim, era uma contradição em termos. Marcou porque me fez ver que isso não é vida. Isso que eu vivo não parece vida. Não é minha, tenho essa impressão. E quando sinto que a vida existe é como se fosse um acesso intenso e rápido a outro plano. Depois a gente volta pra normalidade. Pra a normalidade dos outros. O acordar, o tomar o ônibus, as saídas com os amigos pra algum bar, a volta, etc. Isso me parece dos outros. De todos os outros. Não a minha vida. E é isso que me tem feito pensar que a Vida Está em Outro Lugar. pode estar, do contrário não faz sentido.

Abaixo alguns trechos que me fazem somente busca, nunca apreensão.

“Ela respondeu que naquele quarto estava em sua casa, enquanto que lá onde Xavier queria levá-la não teria nem o seu armário de roupas nem o seu pássaro de gaiola. Xavier respondeu que um lar não é um armário de roupas nem um pássaro numa gaiola, mas a presença de alguém que se ama. Disse-lhe depois que ele mesmo não tinha um lar, ou melhor, para exprimir-se de outra maneira, que seu lar estava nos seus passos, na sua caminhada, nas suas viagens. Que seu lar estava onde se abrissem horizontes desconhecidos. Que só podia viver passando de um sonho a outro, de uma paisagem a outra, e que se ficasse por muito no mesmo cenário morreria”.
“Mas não era apenas um sentimento de culpa que o empurrava para o perigo. Ele detestava a covardia que faz da vida uma meia-vida e dos homens meio-homens.  Queria colocar sua vida na balança e que a morte estivesse no outro prato. Queria que cada um de seus atos, até mesmo cada dia, cada hora, cada segundo de sua vida fosse medido pelo supremo critério que é a morte. Era por isso que queria seguir à frente da coluna, andar sobre um fio acima do abismo, ter a auréola das balas ao redor da cabeça e assim crescer aos olhos de todos e tornar-se infinito como a morte é infinita.
O homem do boné olhava-o com olhos frios e severos onde pairava um brilho de compreensão.
- Pois bem, então vá! – disse-lhe.”
“As horas passadas diante do espelho faziam-no tocar no fundo do desespero; felizmente havia um espelho que o levava até as estrelas. Esse espelho sublime eram os seus versos; havia a nostalgia dos que ele ainda não escrevera, e dois que já escrevera lembrava-se deleitado, como se costuma lembrar das mulheres; ele não era apenas autor, mas era também o teórico e o historiador: redigia comentários sobre o que havia escrito, repartia sua produção em diferentes períodos e a cada um deles dava um nome, o que fez com que num espaço de dois ou três anos considerasse a sua obra poética como um processo histórico digno de um historiógrafo. (...) aqui o tempo era articulado e diferenciado; passava de um período poético a outro e podia (olhando para baixo de canto de olho, para aquela horrível estagnação sem acontecimentos) anunciar para si mesmo, num êxtase engrandecido, o advento de uma nova era que abriria para sua imaginação horizontes inimagináveis.”
E Jaromil jura para si mesmo estar sempre do lado daqueles que querem radicalmente transformar o mundo (Página 141)
“- Acredito que no amor não existe compromisso. Quando se ama, é preciso entregar-se por inteiro.” Página 153.]
“Xavier vivia de maneira totalmente diferente dos outros homens; sua vida era o sono; Xavier dormia e tinha um sonho; dormia nesse sonho e tinha outro sonho e dormia novamente nesse sonho e tinha mais um sonho: e despertava desse sonho e via-se no sonho anterior; e assim ia de sonho em sonho e vivia sucessivamente várias vidas; habitava várias vidas e passava de uma para outro. Não era maravilhoso viver como Xavier? Não estar preso a uma só vida? Ser mortal, sim, mas ter também outras vidas?
- Sim, seria bom...- disse a ruiva. (página 241)”


quarta-feira, 7 de abril de 2010